sábado, 6 de novembro de 2010


1974

Gritos, blasfémias, avantesmas, hemisférios e ciclones.
O meu país é isto e o mais que além se desvenda.
A queda brutal de um teorema.



 

Paris, 14 de Abril

Rui,
Enquanto neste quarto de uma cidade universitária estudo coisas que não me interessam (impossível ser fora da idealidade?) vejo-me esfera no mundo, vertigem de acontecimento único. Quanto mais reflicto, maior me é o sentimento de que me pariu uma raiva que não domino.
Onde vou? Onde vamos?
Deixei os catecismos, a solidão cresceu como um arranha-céus e a certeza tornou-se uma caravela que talvez abarque à Índia.
Ontem escravo, hoje cavaleiro, resta a eterna mudança.
Cresci, não entro já nas portas e, mesmo cortado em postas, só me alcanço mais inteiro. Assim somos, músicos desta cantata em tiroteio.
(Também vejo armadas em manadas de carneiros)
Beijo
 


Paris, 30 de Março
A consciência de que tudo não passa de paliativos.
Apenas a morte é séria.
 
 
 
 
 Lisboa, sem dia marcado, em Junho
Gritos, blasfémias, avantesmas, hemisférios e ciclones.
O meu país é isto e o mais que além se desvenda.
A queda brutal de um teorema.

Paris, Setembro
Na cidade universitária, o recepcionista da Casa Alemã, onde tinha quarto reservado para este novo ano lectivo, demorou mais a atender-me e eu vim embora, deixando Paris VII e a frequência de "Science des Textes et Documents".
A razão das coisas…



Amsterdam, sem data
Yves quer que o acompanhe ao festival de Beirute. Mas regresso a Portugal. Farto de ser estrangeiro.



Lisboa, 15 de Novembro
Hoje vou à festa dos meus anos, dos meus anos, a festa onde vou e ninguém mais, salvo eu, lá vai, à festa onde vou, a dos anos, os meus.
Hoje vou à festa dos meus anos, os anos que faço eu, rodando nos anos em que me vou, descendo ruas de meses e escadarias de dias, rolando até onde não sei.
Hoje vou à festa dos meus anos, sei lá quem os tem, aos anos que já foram meus, talvez vão na rua a esta hora de braço dado com outro que, porventura, faça anos como eu.



Sem dia nem mês marcados
The problem it’s to discover in you who realy you are.
Here I’m writing in english:  maybe my thought will be different now.


Fazer cada coisa como derradeira, a única possível ainda no mundo.
Levar ás ultimas consequências cada decisão.
Esgotar as sensações inerentes a cada acto.
Toda a vida desejado, nunca por menos.



A morte é a nossa maior inimiga.
Vencendo-lhe o medo, aceitando-a, não como superior mas como igual e naturalmente existente, ganhamos o domínio da vida, o prazer do sentimento, o gozo do ser.
A eternidade, aqui e agora.
Nada fazer sem intenção.
Pode acontecer que a teoria não acompanhe a praxis. Então mantenha-se a confiança que nos atribui o que já fizemos, deixando o passado acumular-se.
O rompimento com o mecânico começa no pôr em causa qualquer reacção espontânea.


A impotência das meias tintas sufoca-me a glândula da espontaneidade. No fundo a culpa é minha: rebento pelas costuras e juro que não faço literatura.


Para escrever sobre droga decidi experimentá-la. Agora não consigo descrever um “flash”. Porque é vida pura?
































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